segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Teu

Você não me ligou aquela noite.
Na calada soavam as lâmpadas queimadas..
Agora sem luz, clamavam por atenção;
Soavam como os insetos cegos que as rondavam,
Sem saber que estavam mortas.
Como insultos. Insultos frios.
Há relatos de que, na mesma noite,
Outros mortos, em outros apartamentos, empoeirados,
Queixavam-se por ter ido cedo demais;
Delatavam mamíferos empalhados por não viver,
Por não merecer permanecer intactos.
Apenas boatos, pensei comigo,
Anunciados pelas ruas por gente escandalosa e que fala demais.
Falam demais e alto demais, e me incomodam com assuntos vãos.
Vi em tuas pálpebras uma forma de te mostrar
A escuridão que a faria abrir os olhos, mas, covarde, desisti.
Seguiam-se as horas e eu suava cada vez mais frio.
Veio em minha mente a ideia de lhe escrever alguns versos,
Algo que chamaria tua atenção,
Que a fizesse, enfim, tirar as cordas de meu pescoço:
"Teu será meu suor quando secar,
E até os dentes pelos quais irão me reconhecer.
Teus serão os medos e as sombras,
Tuas as confissões e promessas.
Só com teus pés caminharei.
E por fim, quando tudo vier abaixo,
E todas as chances se cansarem de mim e meu desânimo:
Tuas serão as noites que eu desperdiçar,
Esperando.. Em vão.."

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Horizontes para Estradas Destruídas pela Guerra

Qualquer corpo rejeitaria meus órgãos,
Minha boca, num altar frio, calaria eternamente.
Sou presa,
Me debato.
Na calada da noite, incineram-se os olhos
E carcaças de moscas.
- Meus membros, esquecidos, aguardam o fim.
Quando toda luz se apagar,
Poderei enxergar com clareza a dor que sinto.
Assim que as garotas virarem as costas,
Voltarão as bestas, à farejar merda,
Para mastigar meus intestinos com amargor,
Gesto próprio de mães famintas.
E ficarão os bonecos sem cabeça no chão,
E ficarão os dedos velhos e enrugados,
À praguejar contra a juventude,
À ferir a honra de Judeus amargos.
Doo-te um horizonte de estradas destruídas pela guerra,
Toma e segue teu rumo,
E não voltais aos portões do inferno;
E, quando, mesmo distante, tiver coração,
Ame a mim como a flor que nunca é regada
E que brota, e que ramifica e que murcha,
Amaldiçoando para sempre o solo que a feriu.

Anjos em Dias de Ira

Não saberia lhe dizer como oram
Os anjos em dias de ira.
Se contorcem, deitam em camas de pregos,
Dão tapas covardes nas costas de Deus?
Já não me lembro..
E tu, abaixo deles, ainda que sem expressão nos olhos..
Ousa ser maior e mais amável que tais..
Ousa carregar nas pálpebras fechadas, amores;
Inigualáveis... Incríveis..
Dou-lhe meu lado direito
E, seria um dia comum, caso me destruísse as costelas..
O asco típico das quinta-feiras..
A solidão dos fins de domingo..
Mas não o faz.
Nada em tuas sobrancelhas arqueadas
E olhos expressivos e pele branca e corpo magro,
Nada em ti remete àqueles anjos,
Por carregarem com eles dias de ira,
Céus repletos de ódio... Raiva.
Me ajoelho como metáfora de minha fraqueza,
E glorifico-a.
Por teu corpo no meu, orarei; E farei de mim teu servo.
Não suporto mais os mesmos dias,
Nem quero mais estes anjos de mãos ásperas.
Estou nu, e sou impuro,
Mas quando estás aqui,
Já não sei mais....