segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Teu

Você não me ligou aquela noite.
Na calada soavam as lâmpadas queimadas..
Agora sem luz, clamavam por atenção;
Soavam como os insetos cegos que as rondavam,
Sem saber que estavam mortas.
Como insultos. Insultos frios.
Há relatos de que, na mesma noite,
Outros mortos, em outros apartamentos, empoeirados,
Queixavam-se por ter ido cedo demais;
Delatavam mamíferos empalhados por não viver,
Por não merecer permanecer intactos.
Apenas boatos, pensei comigo,
Anunciados pelas ruas por gente escandalosa e que fala demais.
Falam demais e alto demais, e me incomodam com assuntos vãos.
Vi em tuas pálpebras uma forma de te mostrar
A escuridão que a faria abrir os olhos, mas, covarde, desisti.
Seguiam-se as horas e eu suava cada vez mais frio.
Veio em minha mente a ideia de lhe escrever alguns versos,
Algo que chamaria tua atenção,
Que a fizesse, enfim, tirar as cordas de meu pescoço:
"Teu será meu suor quando secar,
E até os dentes pelos quais irão me reconhecer.
Teus serão os medos e as sombras,
Tuas as confissões e promessas.
Só com teus pés caminharei.
E por fim, quando tudo vier abaixo,
E todas as chances se cansarem de mim e meu desânimo:
Tuas serão as noites que eu desperdiçar,
Esperando.. Em vão.."

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Horizontes para Estradas Destruídas pela Guerra

Qualquer corpo rejeitaria meus órgãos,
Minha boca, num altar frio, calaria eternamente.
Sou presa,
Me debato.
Na calada da noite, incineram-se os olhos
E carcaças de moscas.
- Meus membros, esquecidos, aguardam o fim.
Quando toda luz se apagar,
Poderei enxergar com clareza a dor que sinto.
Assim que as garotas virarem as costas,
Voltarão as bestas, à farejar merda,
Para mastigar meus intestinos com amargor,
Gesto próprio de mães famintas.
E ficarão os bonecos sem cabeça no chão,
E ficarão os dedos velhos e enrugados,
À praguejar contra a juventude,
À ferir a honra de Judeus amargos.
Doo-te um horizonte de estradas destruídas pela guerra,
Toma e segue teu rumo,
E não voltais aos portões do inferno;
E, quando, mesmo distante, tiver coração,
Ame a mim como a flor que nunca é regada
E que brota, e que ramifica e que murcha,
Amaldiçoando para sempre o solo que a feriu.

Anjos em Dias de Ira

Não saberia lhe dizer como oram
Os anjos em dias de ira.
Se contorcem, deitam em camas de pregos,
Dão tapas covardes nas costas de Deus?
Já não me lembro..
E tu, abaixo deles, ainda que sem expressão nos olhos..
Ousa ser maior e mais amável que tais..
Ousa carregar nas pálpebras fechadas, amores;
Inigualáveis... Incríveis..
Dou-lhe meu lado direito
E, seria um dia comum, caso me destruísse as costelas..
O asco típico das quinta-feiras..
A solidão dos fins de domingo..
Mas não o faz.
Nada em tuas sobrancelhas arqueadas
E olhos expressivos e pele branca e corpo magro,
Nada em ti remete àqueles anjos,
Por carregarem com eles dias de ira,
Céus repletos de ódio... Raiva.
Me ajoelho como metáfora de minha fraqueza,
E glorifico-a.
Por teu corpo no meu, orarei; E farei de mim teu servo.
Não suporto mais os mesmos dias,
Nem quero mais estes anjos de mãos ásperas.
Estou nu, e sou impuro,
Mas quando estás aqui,
Já não sei mais....

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Outubro de 2013

-Volto para casa certo de que vi teu rosto.
A cidade chora à medida que a deixo.
Se conhecesse todos teus nomes e faces
Gritaria por ti pelas janelas das casas,
Com pedras prontas para romper as vidraças de teu quarto
Desesperadas, em ânsia por conhecer teu corpo.
Mas como são longos e dolorosos os minutos
Quando se aguarda, em vigília solitária!
A cidade morre enquanto aguardo,
E a noite é escura para os cidadãos;
Nenhum deles atenderá o frio que bate a porta,
Com medo, estarão num canto, agachados,
Zelando por seus filhos,
Para que a mão macabra que os invade
Vá embora sem os levar a alma.
A cidade escurece à medida que parto.
A insegurança é o diabo à me fazer cócegas,
Tremo, rondando um prédio antigo,
Esperando que a fumaça que irrita meus olhos se dissipe,
Para poder dizer que quero minhas mãos frias à incomodar teu rosto.
Quando a noite cessa, o silêncio é tudo..
A cidade se acalma; dorme tranquila.
Meu coração está quieto,
Meus amores, longe, descansados,
É hora de voltar para casa.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Os Jovens nos Parapeitos

E as sombras e morcegos vem.
Batem ao parapeito de um prédio,
Quase para romper os vitrais das janelas.
E me acordam com fulgor e glória da ansiedade asquerosa
Que toma nas mãos (e quebra) os queixos dos fracos.
Minhas facas apontam apenas à mim,
Ao meu fígado e pâncreas.
Perfuram.. E a sangria me cura,
Perfuram.. E a sangria me drena,
Drena de ti e teu nome tatuado nas veias;
Restam as ocas lembranças dos olhos cegos,
Agora certos de que um novo dia -
Um dia pior e mais desesperador - virá.
Cairá dos céus como uma praga,
Pulsando nas entranhas dos morcegos;
E, na escuridão, as janelas de meu prédio estarão abertas;
Suas cortinas agitadas, à flamular,
Serão uma bandeira para os apartamentos vazios
Relembrando à cidade e aos roedores:
Aqui, um jovem teve o sono perturbado..
Aqui, um jovem desistiu.

Luciana

Não me deixe.
Eu fujo, me ajude, eu choro!
Me transformo nos cantos úmidos da casa,
Me transformo em seus ecos malditos,
Neste cômodo tosco e mal reformado.
Me tranque no quarto, não me deixe sair.
Nem me esvair pelas janelas dos pesadelos,
Não me deixe!
E eu implorarei aos quatro cantos que me faltam,
Que me faltam pra me dar a forma
A forma dos monstros que me dissecaram.
Luciana,
Você vai mesmo sonhar com outros olhares?
Apague meus olhos, então, quando se for.
E sorria a velhice de animais com fome
Num descampado de alimentos escassos.
Como chegaremos, secos até os ossos,
Aos pés da figueira sagrada do senhor?
Cuspirei nas carcaças de seus cães,
Mas eu te invejo e me arrependo,
E me envergonho porque ainda existo,
Magro e torto e torto e sem sonho, e sem importância e sem vontade e nem quero saber,
E..
Me contorço angustiado fingindo que não me importo.
Peço ajuda, indigno e peço que esqueça,
Ou que volte ao campo seco e chore por mim,
Se arrependa por mim,
Se envergonhe por mim,
E depois.. Me deixe.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Papo de Herói

Vá na frente e salve o mundo,
Eu vou ficar bem!
Escorreguei no banheiro,
A porcelana rachou..
Agora sou um sobrevivente.
Meus sonhos racharam
E o espelho e meus filhos.
Escute, sou seu pai,
E eu tenho razão,
Você não tem problemas
Que sejam maiores
Que aquelas cabeças gigantes
Situadas no norte do perú.
Já eu sou o gigantesco matador de baratas.
Conversa nojenta de sempre,
Ela bateu na minha bunda,
E eu não fiquei de pau duro.
Será que é o cigarro?
Enfim alcancei meu eu do futuro?
Estou ficando broxa? Virei viado?
Hoje é dia dos pais,
Ele não vem me visitar
Não tem problema, não
Vou juntar umas moedas
E pegar um ônibus
Que gira ao redor da cidade
e volta no mesmo ponto de sempre.
Falo sério, mesmo,
Se você tiver nas veias um líquido vermelho
Não vai me entender,
Meus problemas parecem monstros
Parecem monstros feitos de sombras
Eles riem à noite.
Eles são maiores que os seus.
Vá em frente, salve o mundo sem mim,
Eu vou ficar bem..
Ou não..
Papo de Herói.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Os Conselheiros

Contam-se as almas sujas de frieza
Como contam-se tripas de cachorro
no asfalto de uma avenida à meia luz.
Os conselheiros se reúnem para mais um dia turvo e inócuo.
Multiplicam-se as mãos frias sobre a mesa
E racham-se as testas para a abertura da cerimônia.
Estouram-nos, arrombam-nos narizes
Para sangrar as mil garotas em overdose de ketamina.
Os conselheiros riem para amores que se afastam.
Afastam-se para trepar a noite toda com nossas namoradas.
Os sábios arrancaram as árvores pelas raízes,
Apunhaladas por seu otimismo.
E transaram sem amor a noite toda,
E colocaram chapéus pela calçada por esmolas.
Nós pisamos sobre nossos órgãos genitais,
Até gozar sangue na sarjeta.
Foi assim que aprendemos e que Jesus previu que seria.
Porcos imundos do mundo, garotas imbecis do mundo,
Uni-vos! Ouçam já a decisão dos conselheiros.
É dado toque de recolher para sentimentos e riscos,
Deitem-se todos, golas nos trilhos,
Já vem o Diabo contar suas almas!
Ou são elas as tripas de cachorro na avenida?

quinta-feira, 11 de julho de 2013

O Pecador de Carne e Osso

Para as mãos do Pecador de carne e osso
Todos os crânios e fêmures medem milímetros.
Os erros à Ele nutrem. Alimentam Su'Alma.
Não clamarão como passado. Sequer calarão
O calafrio noturno da sinfonia dos não-nascidos.
A noite em claro da desgraça eminente e o aguarde pelo bote da inexistência;
Esses se farão eternos.
O poder de estancar o coração com as próprias mãos,
Vingar-se de si, de seu fruto que nada tem de sagrado.
O ódio de ser Aquele que vem na noite para abafar os gemidos
E trazer o manto da morte às garotas indefesas.
Sangra entre as pupilas do esgoto a rã, desidratada,
Prepara uma única valsa com a merda, com os dejetos.
Somos nós refletidos na porcelana dos pesadelos?
São nossas faces a dos monstros embaixo da cama das crianças?
Ah! Nem vem Deus ceifar o pecador de carne e osso.
Deus o teme por não temer aos Deuses.
Não existe Deus, na noite do desespero.
Só o sentir-se imundo e a placenta vazia dos sonhos.
A partir de agora, o mundo será melhor.
A partir de agora, o mundo irá cessar.
Limpos os restos dos animais e do Remorso
Na sala branca da impureza das vontades,
Tudo que resta são as mãos ensanguentadas;
As mãos do arrependimento regurgitado,
Do Pecador de carne e osso.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Aborto / Asfixia

Aborto,
Como a libertar do cárcere do ventre o filho,
Como a libertar da chance de formar olhos,
E da chance de que eles brilhem.
O cordão umbilical esgana o feto,
Engasgado pela placenta que escorre por entre as pernas de uma garota
Que se debate num banheiro imundo,
Vomitando misoprostol entre sangue e tripas.
Coagulado o útero agoniza,
Entre espasmos, seca as entranhas e sufoca a vida.
E é tudo que resta nos esgotos, boiando com os filhotes de ratos mortos,
Cãibra para os nossos iguais malditos
E a inabilidade de respirar uma vez, sequer.
...
O descaso desolador esmaga os prédios da cidade,
Em uma de suas janelas, remoendo a insônia do remorso,
Ela chora.
Chora uma existência ectópica,
Um ventre abcesso, miserável.
Chora o fruto rejeitado dos erros cometidos,
Que reage com dor e maldição à mão macabra que o corta pela raiz.
Chora, pois, ao debater-se por sua vida,
O veneno maldito do Sal, mais uma vez, a venceu.

sábado, 29 de junho de 2013

Desisto

Aos poucos as sombras se afastam
E com elas, as sombras das portas;
Outrora abertas, agora lacradas
E de dentro os fantasmas riem.
Zombam de nós com tal frequência
De zunidos nos ouvidos, semi-surdos,
Ouvidos surdos não imploram aos pés de gigantes medíocres
- Quem dera que logo falhassem, deixando-me abandonado às traças.
Mas não se vão, porque precisam de mim,
Amaldiçoados e sujos tímpanos, tem necessidade de meu sangue!
De meus músculos, de minha força,
A força com a qual ajoelhei-me e me arrastei pelo teu quarto imundo.
...No lixo acumulam-se seringas.
O mérito dos dias bons.
"Se esses são os bons, que dirá os ruins?"
- As distrações não me enganam, são cálices cheios de álcool
E totalmente vazios de esperança.
Então é isso, o mundo melhor que me prometeram?
Jovens estrangulados em porta-malas de carros?
Jogar das janelas papéis picados, sujos de merda?
Desisto.
Nego à Ti, Deus, Nego ao Diabo e ao compromisso de ser amigo.
Porque me negam a perspectiva de vida.
Me negam, me negam, há anos,
E depois de tanto..
E só agora..
Desisto!

Prosopagnosia

Máquinas rasgam o asfalto lá fora;
Aqui dentro, os gatos se ouriçam,
Cospem as asas de pássaros semi-vivos,
Arrancam-lhes o coração, sem matar,
E trazem-nos, com olhos de piedade.
Entre pesadelos de sexo nojento com garotas solitárias,
Deitamos de bruços, para ser estuprados.
Jamais tocarei seus rostos..
Estas garotas jovens e sozinhas,
Todas elas, oniscientes afrodites,
Se enforcam entre promessas e fios telefônicos,
Pelos quais suas mães mortas se comunicam;
- Com ódio, fofocas mesquinhas e aquelas velhas mentiras
Próprias de pessoas vivas.
Ah! Os cadáveres sem ossos!
Que ânsia, soprá-los contra os lagos insondáveis do esquecimento!
Como um rato sem olhos, esfaqueá-los sem me aproximar..
Sorrateiro, contorcer suas peles nuas,
Conhecer o sangue que emana de suas costelas.
Mas nem ao menos poderia dizer quem são!
Jamais saberia reconhecer seus rostos,
Suas faces, devastadoras de tão belas.
Então as deixaria sofrer, neste deserto
De carros infinitos rasgando o asfalto,
Porque foi assim que me abandonaram:
Inalcançáveis, Vomitaram um paraíso de belos seios,
Mas de chagas gigantescas.. Incuráveis..

segunda-feira, 6 de maio de 2013

Ensaio Sobre a Ferrugem

Tudo bem
Vou vomitar o feno e seguir em frente;
Procurar na lama algum tipo de chave ou adaga.
Os fardos de falha sendo arrastados
Pelo chão de cômodos vazios, ecoam.
Soam como uma pedrada bem no meio do rosto.
Desfigurando irmãos, crianças de seis anos e meio,
Inócuas por sua grande natureza.
Me arrependo por ter deixado meu corpo inerte à teu lado.
O lodo e o fungo que não me deixam dormir à noite,
Pertencem também à teus lençóis.
E vem a culpa respirar a ferrugem de minhas janelas, outrora abertas,
Na noite em que descansas tranquilamente.
Almejo, com todas as forças,
Destruir os ossos de sua mandíbula
E entupir nossos filhos com doces que dão cáries.
Almejo destruir as louças herdadas de sua mãe,
Deixá-la para trás. - Velha, cataplética
Num quarto imundo de hotel barato à coexistir com baratas.
Amaldiçoo o fruto do ventre que inalou carbono por tanto tempo,
Pela piedade e fraqueza dos tendões de meus dedos.
O cálice de água suja era meu e dele só eu deveria beber,
Mas você, com suas mãos sorrateiras o agarrou
E seus olhos frios me afastaram dele por certo tempo.
Maldito tempo foi este - Agora piso em seu intestino e
O observo se debater, no chão.
Te odeio por ter me prometido tanto e ter me dado tão pouco.
Por ter me deixado de lábios secos, à espera de água ou afeto.
Tudo certo, tudo bem, mesmo.
Vou continuar.
Vomitar o feno que me enfiou pelo ânus como um estupro,
E seguir em frente, rumo ao fundo de meu poço de merda.

terça-feira, 23 de abril de 2013

Os Homens Trancafiados

Muitos carregam chaves,
E cortes de cacos de espelho na testa,
Em vitrines de bordel
Prostituem suas honras (Mirradas, baixas).
Apertam os dentes uns contra os outros,
Entre olhos paranóicos de câmeras
E canetas de lâminas afiadas.
Outros carregam cadeados
Pra viver com os pescoços
Entre barras de ferro.
Trancafiam os olhos
E esfaqueiam o próprio peito
Por ódio de seus filhos.. esposas..
São os auto-gestores,
Os verdadeiros auto-gestores do mundo,
Os suicidas.
Com seu controle titereiro,
Encantam bonecos sem braços.
Todos anseiam, todos calam;
Por vergonha mordem os lábios.
São os cães do mundo,
Os verdadeiros cães do mundo,
Os homens cegos que andam em fila;
São os cães do mundo,
Os verdadeiros cães do mundo,
Os homens abraçados por aço
Com medo de dobrar no meio
Os fêmures de seu ódio e repulsa.

"..E porra, eu queria dizer alguma coisa realmente importante,
Digna de ser lembrada numa hora dessas,

Mas eu não consigo pensar em nada, só nisso:
Uma desculpa.."

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Ninguém Afronta Deus e Sobrevive para Debochar

Choro.
Volto os olhos para o chão,
Onde as escrituras trovaram que eu me arrastaria,
E choro.
Castro com sal os vermes que me escoriam com sua intimidação.
E gargalho cruelmente;
Porque não os afronto; Porque Existo e não os afronto.
Dilacero seus intestinos, estupro seus direitos,
Porém não fito seus olhos com afronta.
Tornei-me uma piada de mal gosto.
Não sou ameaça para os filhos dos santos
Que me acariciam com piedade,
E cujas mãos vão ser amputadas pela sarna que dissemino.
Quem há de reger então
A orquestra dos vermes que se alimentam de minha alma?
Eu, que
Faço da arte a desgraça mais rasa
E cuja face sem vida,
Beira um alerta de maços de cigarros baratos.
Eu, que
Quebro os braços e a coluna de uma garota -
Observo-a enquanto se contorce e se adapta à nova era:
Arrastando-se, vomitando pelos ralos e pias de cozinha.
Eu, que
Amanheci coberto de lodo,
Suportei a chacota de um Deus sádico,
E hoje sou só
Uma piada de mal gosto.


"Ninguém afronta Deus e sobrevive para debochar"  foi uma frase usada por Feliciano referindo-se às circunstâncias da morte de John Lennon.

terça-feira, 2 de abril de 2013

Sob a Sombra da Humilhação

Degole-me em lençóis sujos de merda,
Minha cabeça, histérica, anseia descansar.
Morda minha língua e cuspa meu ódio,
Drene a sede de miséria que me visita
Ao cair de toda maldita noite.
Foram vinte anos de olhos baixos,
E marcas de suas solas em meu rosto.
Foram vinte anos de murros contra a parede
E de mãos esmagadas, em migalhas.
Sou um cão aleijado por seu descaso;
Os cigarros pintam de preto minha alma,
E agora hão de apodrecer também meus braços.
Apresento-lhe minhas pupilas;
Cobertas de sangue coagulado e incapazes de se expandir;
Estão cegas, mas ardem ao sentir sua presença,
Quando você se aproxima, sorrateiramente,
Para pisar em minhas mãos assim que eu tentar me levantar.
Sempre encurralado, cresci à sombra de sua superioridade.
Sempre no escuro, arrastei meu crânio pelos cômodos.
Chegou a hora de terminar o que começou.
Esmague-o. Destrua-o...
Esqueça-o...

segunda-feira, 18 de março de 2013

Ratos Prenhes

Mesmo soterradas pela argila,
Nossas carcaças despertam para a madrugada.
Gravamos nossos nomes pelas árvores escravas
Que se distribuem através do jardim da tristeza
E enfiamos os dedos na garganta afim de vomitar ódio,
Só para descobrir que éramos vazios.
Nossos rins riem de nós,
E o Sol nos dá de ombros;
A coleira com que o Diabo nos vestiu,
Agora serve de cordão umbilical,
Alimenta-nos do sangue que irriga os olhos dos mortos.
Toda essa nudez porca me enoja.
Essa piedadezinha medíocre e esse senso de superioridade patético.
Somos ratos, que, embora prenhes, agora mordem as próprias unhas
E arrancam as orelhas de seus amigos.
Já meu filho está morto. Sinto seu coração, parado,
Apodrecer em meu útero.
Nenhum ser vive só de ácidos e alcoóis.
Nenhum ser vive só de tristeza e solidão;
Arranque-me as pernas, não sou digno;
Entregue-me aos Senhores e reis;
Nos lençóis sujos de minha cama sub-vive uma garota triste.
Encardida, esquálida, inibida.
Sorriu-me algumas vezes no passado,
Agora, deformada, vai me esperar a noite toda,
Mas já não sou capaz de voltar.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Vire as Costas

O fim da tarde encaixa-me
Como um abraço cadavérico e frio;
O vazio, varrido pra debaixo do carpete,
Visita-me.
Tua ausência faz-se mãe de minhas deformidades,
Toca meus braços, com afeto e os arranca.
Só em teu nome hei de descansar,
E ao pé de tua sombra, colossal, repousarei.
Pisa em minhas mãos ou deixa-me de lado;
Escolha, de punhos cerrados e vire as costas.
Não acenderei velas como um retardado,
Ou cigarros para comemorar a sua chegada;
Nem esperarei em vigília noturna.
Ausentarei-me. (Prometo).
E depois que tudo for pó
E só a noite restar, para caminhar junto à mim,
Cospirei em minha própria lápide,
E morderei a língua para disseminar o veneno.
Cem covas hão de enfileirar-se, vazias,
Cavarei-as, uma a uma, até sangrar os dedos,
E Engolindo toda a terra que puder,
Engasgando em amores nunca tão imbecis.
Apedrejarei-me, por não ser de teu feitio,
E entregarei meu corpo para que lance aos cães.
Só um pedido há de restar, preso em minha garganta,
Se não fí-lo enquanto era cedo e os sinos soavam:
Não me dê as mãos, em dedos nus,
Se for só por piedade.

quarta-feira, 6 de março de 2013


O Garoto das Asas de Inseto

O garoto das asas de inseto
Alça um voo torto
Sua coluna curva o entristece
Sua coluna triste o encurva.

Damos as mãos, todos;
Os olhos, em resina, paralisados.
O garoto das asas de inseto
Paira sobre nossos ombros
Com a leveza de uma barata.

Os vermes aplaudiriam
Todos os gritos infames na madrugada
E os gemidos de virgens
Os alimentaria a alma

Como a alma que lhe falta.
O garoto das asas de inseto..
O garoto dos olhos de inseto..
O garoto dos sonhos de inseto..
O garoto cuja vida
Custa a vida de um bater de asas,
Curto, infame, impenetrável.

O garoto das asas de inseto
Sorri e chora.
Sorri e chora.
Sorri e chora.

"I started a joke, which started the whole world crying,
But I didn't see that the joke was on me.."

segunda-feira, 4 de março de 2013

Tarde Demais para Dormir

É hora de me deitar.
Quando eu voltar, quando eu me aproximar,
Vai ser tarde demais..
Se sinto os poros trancados pela fumaça,
E gosto de sangue coagulado nas vias nasais,
E se as vistas escurecem.. Nada disso vai importar.
Passa da hora de ficar quieto.
Fito no espelho, meus olhos escuros.
Curvo, constato, não sou mais um garoto.
E o agarro pelos colarinhos,
Aquele que acabou de acender o primeiro cigarro de sua vida.
Cuspo em seu rosto e o amaldiçoo,
Porque meu passado é uma escultura de humilhações.
Um sobre o outro, empilham-se os fracassos,
Quando não suportar carregá-los, mais,
Tornarei-me um deles.
Os músculos de meu peito rompem-se aos poucos..
Isso traz um certo alívio;
Um cigarro para cada derrota diária - Era sua promessa.
E depois de um maço e meio,
E de um Sol nascendo sem vida no horizonte..
É tarde demais para me deitar.
Cuspo em meus pés:
-Filho da puta. Arrancou-me os dois pulmões.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Mal

Não posso existir em mim porque tenho medo do que sou.
Eu sou o feitor de meu próprio mal.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Esqueçam-nos

Dedos magros e brancos
Me sobram nas mãos vazias
Sem rostos p'ra tocar
Sem corpos p'ra repousar

Pra ficar, queria mais
Já não visto minhas raízes
Pra partir, queria paz
Deixar que sejam felizes

Desçam pra ver os fogos
E as olheiras de cem mil rostos
Deixem que meu peito falhe
Sem amor, a vida fale

Nas costas os prantos
Nos pés, estradas frias
Cem rostos p'ra aquecer
Agora um p'ra esquecer

E outros dias para não viver..

[Texto que vai desaparecer em breve, esqueçam-nos, antes que seja tarde demais..]

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Inaudível

Não me movo.
Arregalados os olhos, correm o mármore frio que me envolve.
Há muito; não me movo.
O sangue mancha dos ouvidos aos ombros;
Queima a pele, de dentro pra fora,
As canelas, inundadas pela fraqueza
Que minhas veias distribuem pelos órgãos
Praguejam, tremem e ameaçam ceder.
A dor se guarda em ouvidos surdos.
Nenhum ruído soa em meu quarto.
O diabo é visita em meio à noite.
Pisa em meus pés e me arranca as cobertas,
Deixa um sono leve na madrugada aflita,
Imerso na paranoia de que os olhos se abram
Para ter suas pupilas rasgadas pela penumbra.
A alma é resto, no calor do seio que me ludibria,
Clama;
Eu, inaudível em teu útero;
Eu, intocável em tua noite;
Clamo, grito, me debato e desisto:
Do pó ao pó ao pó ao pó ao pó de teu descaso.
A alma é resto, o que me foi arrancado
Em noites em que suava a ausência de tua calma.
O corpo, um cadáver,
Na treva rancorosa de sua madrugada,
Não se ouve, Não se move.


"Nunca conheci quem tivesse levado porrada
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
Eu, tantas vezes reles,
Tantas vezes porco,
Tantas vezes vil.
Eu, tantas vezes Irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu,
Que tantas vezes não tenho tido paciência pra tomar banho,
Eu que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo.
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante."

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Divino Descaso

De qualquer forma,
Quando o fim dos tempos chegar
Para cobrir as crianças de cinza
Nada encontrará além
Da Ignorância de concreto que cultivamos,
Do lodo dos muros que antes guardavam corações vencidos..
Nosso semblante desesperado,
Perante a culpa pelos destroços das costelas
De nossos irmãos, gloriosos.
(A má consciência é a pior das mortes)
Sob o olhar disperso de Deus,
Na lama chafurdarão os porcos,
As lápides de seus pais, enfileiradas
E todo o ódio que preenche nossos ossos ocos.
Manterei-me distante, prometo,
E rangerei os dentes em espasmos amargos;
Manterei-me distante, e vazio
Para não enfrentar de frente
Olhos Divinos de descaso.

"Você não consegue dormir sem beber e já faz muito tempo que não!"

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Inveja

Inveja, mãe dos ratos
Sorrateira como a praga
Que afaga os dedos pelos quais deslizam
As alegrias, minhas e só minhas.

Sou seco porque assim me faço
Em peças de ódio e agonia
Dilaceradas nas mãos da trapaça
Traças que nos desmembram
(Aos poucos, se aproximam
Como quem não quer nada
Derrotando com louvor.. meu espírito)

Sentada ao meu lado, toca meu queixo
Em queda, fenômeno dos fracos,
Já não sou o mesmo, já não sou bom
Nem resta em mim o cheiro do passado..
(Sobre os dias, apenas lhe digo
Que todos eles são cinza)

Cortando a testa, coroa de espinhos
Que me deste, de aniversário
Dez anos de dores e cães
Ao soar do zero, todos cães nascem
Ao soar dos quinze, todos despencam.
(Mortos, que mal me pergunte)

Escarrados, frios, desgraçados
Cães, senhores dos ratos
Que naufragam em meio a destroços
De um mundo outrora nosso.

domingo, 20 de janeiro de 2013

Casa Vazia

Não há vigília que satisfaça um monstro como eu.
Respirar ar rarefeito, sem trilhos,
A rotina que alimenta os dias dos desgraçados.
Tragar o vapor que emana de um asfalto pútrido
E que faz dos pais, outrora próximos
Fantasmas vagando por uma casa vazia,
A vigiar as correntes que amputam seus pés.
A depressão me desfigurou,
Não vejo como ser mais insignificante que isso,
Um inseto preso entre os fios de seu cabelo alaranjado.
Um amor de verme, que mal causa cócegas ou arrepios.
Poderíamos ter nosso peso medido,
Em pesadelos ridículos de crianças mimadas
E seríamos bem felizes assim, navegando águas rasas, inofensivas.
Mas as ervas dominaram todo o horizonte..
Nasceram. Sugaram a vitalidade da terra, enferrujaram.
E isto forma tudo que resta do futuro,
Eu, um idiota, atrelando correntes aos tornozelos,
E as montanhas cinzas que vislumbrava, mortas.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Eternamente Inamável

Dia chuvoso.
Desde o começo de minha vida,
O cinza destes céus tomaram-me nos braços.
Cresci; Trouxeram-me pela mão,
Inumerosos. Tanto que, muitos deles
Já foram apagados da memória de todos os seres.
Não me tornei amável ou fiz diferença,
Não sou especial.. Pelo contrário: Sou ainda o filho aleijado.
Acho que não bebi o suficiente hoje.
Não abri os olhos o suficiente
Pra que decorasse os traços de seu rosto,
Ou para encontrar as cores do seu cabelo num catálogo de loja.
Tocou meu rosto frio e pálido,
Apertou bem e disse: É agora!
Deus rasgará os céus para pisar em nossas cabeças!
Sempre te amei, desde o começo. O seu sorriso..
Você não quer morrer,
Quer viver outra vida que não a sua.
É algo que entendo. Faço parte da sua vida,
A chance de ela ser boa é, então, mínima.
Vai se convencer de que é necessário,
Ainda assim você não quer.
O mundo respira lá fora,
Somos egoístas demais pra ver isso,
Mas não no escuro. Não esta noite.
Preciso respirar aliviado, também;
Se eu pedisse pra cuspir em meus lábios, o faria?
Agradeço à todos os seres, o descaso que guardam por mim,
Com zelo nunca antes visto.
Meu espírito há muito já não vive,
Se coça na forma de um cão desgarrado;
E agora, sobra meu corpo;
Prostrado com maestria no seio da desgraça,
E Prova viva de que alguns nascem
Eternamente inamáveis.


"Você não pode entrar na minha gangue se não fumar"
"Eu não quero estar na sua gangue"
"Nem eu"

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

A Promessa de Deus

Sopra a poeira de meus ossos serrados
Se perdem entre nuvens cinzas.
O amor esmagou minhas costelas,
Envolto ao silêncio que me assobia:
Meu estado é terminal, e estou perdido e sozinho.
Sento-me a beira de um abismo,
A marca dos pés desgraçados de um Deus, que
Desceu a Terra, se fez homem, e arrancou de mim os olhos.
Vês a distância entre Ele e um escravo?
É nula! Criaste-a como linha imaginária;
Por não ter olhos, agora enxergo com clareza..
Posso até prever o próximo passo!
:Aqui, entre as raízes que degeneram a Terra,
As máscaras perderão sua feição,
Filhos bastardos terão seus umbigos arrancados
E os animais enlouquecerão para sempre.
As árvores, em ato egoísta, caírão,
Cortarão os caules e cospirão carbono,
Disseminando câncer entre os filhos prediletos.
Ah.. Já posso ouví-las gargalhar com seus ramos
E fazer chacota enquanto órgãos falham.
Posso sentir gargantas à sufocar e os lábios à formigar...
E mesmo assim, em face do abismo e do apocalipse,
Muitos passarão por mim e dirão que estou insano,
Que nada disso existe, que sou uma farça, um ateu..
Logo proponho, agora mesmo, à estes o seguinte:
Fitem o olhar de um homem na rua,
E vejam nele o reflexo de um Deus sem alma.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

O Reino do Ódio

O toque frio ecoa pelos escombros
Da cidade que faz do amor, fumaça rarefeita.
Parafusos e ossos derretem,
Escorrem sobre os olhos dos justos;
As máquinas rasgam os circuitos,
Fazem das entranhas, engrenagens
Para apontar para gênios e idiotas
Que o mundo já acabou há décadas.
Os fogos estouram para anunciar um novo ano,
Esta dádiva, O dom de Deus,
Agora encuba em suas costelas, o Ódio.
Os órgãos não alimentam, drenam.
O corpo rouba da alma, sufoca o espírito;
Esfrega-se em outro, esquálido, aidético,
Até fazer espuma, faísca.
Sombras se tornam maiores que Deus;
Do centro da Terra brota uma erva mesquinha.
Com olhos de águia e focinhos de lobo,
Os humanos em filas, pelo asfalto,
Fracos, sarnentos.
Calcanhares racham. Cotovelos esfolam.
Sorriem dentes podres e cospem saliva seca;
Degeneram-se de braços abertos.
Todos são bem vindos, no banquete do Novo Mundo.

"Quando a fumaça se dissipa no ar,
Não se sabe quem é máquina..
Quem é homem.."