quinta-feira, 22 de novembro de 2012

O Cão que Não Soube Odiar

Não sou capaz de sorrir..
Devolvam-me a alegria;
Façam-me florir,
Mostrem-me um novo dia!

Ou deixem-me em paz,
Pra m'afogar
Entre o desafeto..
Não suporto mais
Me arrastar,
Deixem-me quieto.

Encarno um cão sem alma
Co'as entranhas na calçada;
Tarda a sorte escassa
Sob a luz da lua, pálida..

O caos de seu ódio, respiro,
Deixem-me aqui, trancado,
Me esqueçam, sou tempo perdido,
É minha culpa ser rejeitado..

Mesmo que finja,
Me preparar p'rum recomeço,
Toque-me e sinta,
Por fora, vivo..
Por dentro, apodreço..


Credo

Agora já tarda
A lua no céu, branca.
Cedo, um cão, soberano
A lamber as tripas do asfalto.
Crédulo, entre espasmos,
Partir os céus por pão.
Seguimos, em marcha,
Para poder chorar juntos,
O amor ultrajado
Entre véus descrentes.
São tantos tons de preto
Em minha face
Que já não sei qual vestir.
É tudo tão cego, no horizonte.
Já tarda, a noite,
Não adianta fechar as cortinas,
E orar por um estupro;
Posso lidar com essa dor,
Só me dê um tempo,
Para descansar a cabeça.
Não me destaquei,
Entre os mímicos,
Surdos por natureza;
E acariciei as traças como àmigas;
Não me sobressai,
E a lua, cortês, me sorriu,
Um adeus companheiro.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Em Torno do Ódio

As moscas se uniram
E da merda planejam
Acabar com os anjos...
Desamarrem os pés das pombas,
Meus olhos secam
Diante de tanta maldade.
Deem-lhe novas asas,
Despencarei ao seu lado..
Arrancarão meus dentes,
Água escorrerá,
Fazendo dos campos, lama.
O verde há de se esconder
Entre carrancas de bronze,
E joelhos doloridos;
Ouvidos vão zunir..
Devolvam-me a alegria! Ela me pertence!
Meus olhos estão borrados,
Isso não é nada,
Um pequeno ralado nos pulmões;
Não é nada, mesmo..
As ruas estão fechadas,
Parece-me um velório.
Malditos! Estão envelhecendo!
Seus amores sofrerão de Alzheimer..
Malditos serão seus nomes!
Isso não é nada, perto do resto..
Vejo você em meus sonhos,
Cada vez mais bela,
Mais pálida, mais nua..
Coloco-a num pedestal torto
E a glorifico como à um anjo morto.
Entre cavalos, aflitos,
Com ódio no olhar e sangue nas veias,
Suas glórias me colocam de joelhos...
Fazei de mim, fiel, meu Deus!
Fazei de mim, fiel e
Colocai-me em cultos vazios.
Cala-me para sempre, senhor;
E na terra sucumbirá,
Numa caixa cheia de cupins
Meu corpo, inanimado.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

15/11/2012

Dez horas e dois minutos; Uma noite fria.
Nem sempre foi assim.
Até as sombras tremem
Perante a penumbra que cobre a cidade.
O último trago do cigarro queima,
Seguro a fumaça nas entranhas,
Corre-se sempre o risco de ser o último.
Do maço? - Da existência.
Este mundo é escombro de outro
Que um dia aqui existia.
As casas, as crianças - Apenas cimento.
Todas as mulheres são prostitutas
Desesperadas e correndo pelas ruas..
E hão de cair....
Uma nova era surge,
Escorrendo do sangue de outra;
Vamos todos morder a língua
E não vou mais me importar
Se agonizar na beira da estrada;
Atropelado, estuprado; morto.
Endireito-me.
Um cão me segue, triste...
Alimentei-o por muito tempo
Agora terei de pisar em sua cabeça.
O hoje é tarde demais.
Para nós dois, é tarde demais..
Não é que o passado era melhor,
É que não quero me acostumar à essa merda.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A Lagarta

Adorai porque é sagrada
Minha existência desgraçada.
Me acuda! Me acuda!
Passei a sentir o sangue correr!
Sinto-me em desespero..
Aprendi a sentir o frio,
De dançar sozinho
Num quarto vazio.
Jamais alcançarei algo
Próprio de outros insetos.
As folhas caem, num ritual
Para mim, de nada vale.
Um humano risca um fósforo..
Acordai! Acordai ó Cristãos,
Que há chego a hora.
Levantai e acendei velas para nós;
Que somos feitos de fumaça.
Larvas adentram as narinas,
Mesmo morto, agonizo.
A noite, banquete para as trevas,
A angústia me faz trêmulo,
Assim, cravado em meu nome,
Que é nome de meu pai
E de seu pai, antes dele.
Já não faço parte,
Me alimento de fezes no chão,
Compro as mãos que não me foram dadas.
Adorai porque é sagrado
Ser humano e desgraçado.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Ninguém se Importa Com o Cão Sem Dono

Ninguém se importa
Se um cachorro velho
Destes que correm ruas frias
À se alimentar de restos,
Morrer à beira da calçada.
Mandíbulas presas, trancadas..
E as pernas à arrastar correntes..
Nadamos pra morrer na praia
E esse é o fim dos dias.
Filhos e filhas do mundo, uni-vos! [Que piada!]
Fedemos tamanho o mau gosto
De ainda caminharmos..
A carniça impregna à distância..
Os pássaros, assustados, voam..
Por ainda caminharmos..
Você será astronauta e eu serei escritor
Num sonho só meu, que guardarei
Com esperança nunca vista por velhos catatônicos.
Mas num instante macabro,
Enquanto você estiver nos céus
Mil foices rasgarão as nuvens,
Para decepar os infiéis..
E você não estará do meu lado
Pra fechar meus olhos enquanto
Meu corpo for dilacerado pela raiva..
Sou incapaz de te odiar por isso.
Ninguém se importa..
Ninguém se importa..
E, se vier me visitar, de lábios rachados
Em uma cama de hospital..
À me alimentar de restos deixados
Por cachorros mortos em dilúvios..
Abraçado pelo mesmo ódio
Que derrubou aqueles antigos penhascos..
Vai encontrar um ser desprezível,
Que nada traz daquela criança amável que fui.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

A Pedra

[Primeiramente quero deixar claro que não é um poema..
Não é um dos meus textos, nem nada..
Acho que é uma espécie de desabafo, só]

A Pedra


Tenho um cisto na cabeça.
Em algum lugar no lóbulo frontal..
Se encaixou num espaço onde normalmente, não há nada.
Se instalou ali, se acomodou.
Como eu, apenas um pouco deslocado, na maioria do tempo.
De vez em quando tenta crescer,
Mas não é capaz.
De vez em quando tenta se mover,
Mas não é capaz.
Talvez seja câncer;
Como eu;
Me conhece por dentro,
E de lá, há de me destruir. [aos poucos?]
Quem estará do meu lado então,
Quando o chão resolver que quer
De volta a matéria que peguei emprestada?
Quem há de me ouvir então,
Ao cair da última folha?
Tenho um cisto na cabeça,
Vai me derrubar num dia qualquer..
E então, de vista cega e já paralisado e definhando,
Quem há de chorar?

"Tu és Pedra e sobre ti construirei minha igreja"